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Fitopatologia aplicada no manejo de doenças em grandes culturas

Figura 1. Coletor de esporos instalado em área de soja e cana-de-açúcar em Pindorama-SP. A. coletor de esporos a 1,60 metros de altura do solo; B. Lâmina de microscopia e fita adesiva dupla face transparente; C. brotação da cana-de-açúcar. Fotos: Renato Boreli Silva

A quantidade de danos gerados pelas doenças que ocorrem em grandes culturas como a soja, trigo, citros, cana-de-açúcar, algodão e outras, tem causado preocupações constantes a produtores e pesquisadores. A FAO estima-se que anualmente entre 20 a 40% da produção agrícola global são perdidos para as pragas e doenças e a cada ano, as doenças das plantas custam à economia global cerca de US $ 220 bilhões (Montuori, 2020).

As doenças de plantas é o objetivo central da Fitopatologia, e esta, é a ciência que estuda esse fenômeno em todos os seus aspectos desde a diagnose e sintomatologia, passando pela etiologia e epidemiologia, até chegar ao manejo.

Atualmente a fitopatologia se desenvolve principalmente em três abordagens: a abordagem fisiológica, na qual as doenças de plantas passam a ser encaradas com base nas relações fisiológicas, dinâmicas entre a planta e patógeno; a abordagem epidemiológica, baseada numa visão holística de como as doenças aumenta no campo; e a abordagem biotecnológica, utilizando da tecnologia do DNA recombinante para a busca do entendimento de padrões genômicos entre organismos e de expressão gênica para a identificação de genes de resistência para as principais doenças das culturas agrícolas (Amorim et al., 2018).

A abordagem epidemiológica tem grande importância para o manejo das doenças, visto que se utiliza de conhecimentos básicos como a diagnose e monitoramento da incidência e severidade da doença no campo, para a recomendação racional dos fungicidas e inseticidas (controle de vetores) nas culturas. Um exemplo de manejo racional das doenças em grandes culturas é o realizado por extensionistas e pesquisadores da IDR-PR e Embrapa-soja no Estado do Paraná para o manejo da ferrugem asiática da soja (Phakopsora parchirizi), onde se utiliza da inspeção a campo e o monitoramento com a ferramenta coletor de esporos, que possibilita detectar os uredósporos do fungo, transportados pelo vento, antes da manifestação sintomática nas plantas, possibilitando assim o manejo técnico e econômico da doença (Igarashi et al., 2016; Oliveira et al., 2020; Seixas et al., 2020).

A observação detalhada dos sintomas e sinais das doenças nas plantas e o uso do coletor de esporos (Figura 1) ajudam engenheiros agrônomos, técnicos e aos produtores a serem mais assertivos na diagnose da doença e na determinação do momento ideal de aplicação dos fungicidas para diferentes grandes culturas.

Note os detalhes dos sintomas da mancha marrom da soja causada pelo fungo Septoria glycines e da cercosporiose causada pelo fungo Cercospora kikuchii (Figura 2), você consegue verificar as diferenças entre elas? Podemos observar que as lesões da mancha parda são angulares, de cor castanho-claro, e apresentam halo amarelo em torno das lesões, já as lesões de cercosporiose são irregulares e difusa, não possui bordos delimitando a lesão, apresenta coloração castanho-escuro e com halos cloróticos. As pequenas diferenças nos sintomas aumentam a acurácia para a correta identificação da doença e permite a escolha de um fungicida eficiente para o agente causal.

 

Figura 2. Manchas foliares na soja. A. sintomas de cercosporiose e conídios de C. kikuchii; B. sintomas de mancha parda e conídios de S. glycines. Fotos: Renato Boreli Silva.

 

O monitoramento com o coletor de esporos permite observar a ocorrência dos esporos na área de cultivo e assim conseguimos utilizar dos fundamentos do triângulo da doença com maior clareza, uma vez que, para que ocorra a doença, precisamos que os três vértices do triângulo estejam se completando, tendo o hospedeiro suscetível, a presença do patógeno virulento e o ambiente favorável.

Na Figura 3 são esporos de três importantes doenças fúngicas da cana-de-açúcar observados na lâmina do coletor: a ferrugem marrom causada por Puccnina melanocephala; ferrugem alaranjada da cana causada por Puccinia kuehnii e o carvão causada por Sporisorium scitamineum. Imagine que o clone da cana-de-açúcar seja susceptível a essas doenças e caso o ambiente estivesse favorável, com previsões de chuva, saberíamos que o risco de ocorrência da doença seria alto, podendo até iniciar uma epidemia na população de plantas, caso os sintomas fossem observados tardiamente.

 

Figura 3. A. Uredósporos de P. melanocephala; B. uredósporos de P. Kuenii; C. teliósporos de Sporisorium scitamineaum. Fotos: Renato Boreli Silva.

 

Em busca da produção sustentável de alimentos, a fitopatologia aplicada pode contribuir economicamente na intenção de manter ou elevar a produtividade das culturas, maximizar os rendimentos e racionalizar os custos; ambientalmente na preservação do ecossistema diminuindo o impacto dos defensivos agrícolas; e socialmente em busca de garantir a qualidade de vida para o produtor e consumidor.

 

Referências

Amorim, L., Rezende, J.A.M., Bergamin Filho, A. Manual de fitopatologia: Princípios e Conceitos. Ed. Agronômica Ceres, v.1, 5 ed., 573 p. 2018.

Igarashi, W.T., França, J.A., Silva, M.A.A., Igarashi, S., Saab, O.J.G.A. 2016. Application of predicton models of soybean rust in two crop seasons, in Londrina, PR. Semina: Ciências Agrárias 37(5): 2881-2890. http://dx.doi.org/10.5433/1679-0359.2016v37n5p2881

Montuori, M. 2020. Recognising the importance of plant health in today’s world. South African Journal of Science 116(11-12): 1-2 http://dx.doi.org/10.17159/sajs.2020/8966.

Oliveira, G.M., Heling, A.L., Possamai, E.J., Seixas, C.D.S., Conte, O., Igarashi, W.T., Igarashi, S. 2020. Coletor de esporos: descrição, uso e resultados no manejo da ferrugem asiática da soja. Londrina: Embrapa Soja, Circular Técnica 167, 17 p.

Seixas, C.D.S., Possamai, E.J., Reis, E.A., Oliveira, G.M., Heling, A.L., Oliveira, A.B., Lima, D., Silva, G.C. 2020. Monitoramento de Phakopsora pachyrhizi na safra 2019/2020 para tomada de decisão do controle químico da ferrugem-asiática da soja. Londrina: Embrapa Soja, Circular Técnica 164, 28 p.

 

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2 respostas

  1. Tive o prazer de ser orientado pelo Prof. Dr. Renato Boreli em parte do experimento do Monitoramento do MIP e MID da cultura da soja, realmente foi uma experiência única e de muitos conhecimentos absorvidos pela capacidade única de nosso orientador.

  2. Caro Robinson, obrigado pelo seu comentário e por acessar a Physiotek! É muito gratificante compartilhar o conhecimento, experiências e saber que foi de valia.
    Grande abraço!

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