Figura 1. Trabalhos realizados desde 1970 explorando a eficiência nutricional de fósforo (P) em diferentes culturas agrícolas. Fonte: PubMed
A interação P × Zn no algodoeiro vem sendo alvo de discussão por muitos anos. As particularidades das respostas genotípicas a essa interação têm fomentado uma série de discussões acerca dos fenômenos fisiológicos que envolvem a homeostase P-Zn no metabolismo vegetal. De uma maneira geral, os resultados descrevem mecanismos de regulação de absorção e uso desses nutrientes, sendo que a deficiência ou excesso de cada um deles modifica o balanço nutricional (BROADLEY et al., 2010; PONGRAC et al., 2018; SANTOS et al., 2019; PONGRAC et al., 2020). Contudo, Santos et al. (2019) demonstraram que a adequada concentração de Zn foliar no algodoeiro pode aumentar a eficiência nutricional de P. Foi observado que plantas de algodão deficientes em Zn reduzem seu controle na absorção de P, da mesma forma que uma nutrição adequada de Zn no algodoeiro aumenta a capacidade de absorção e uso de P em algodoeiro quando cultivado em condições de P limitante.
A deficiência de Zn no algodoeiro prejudica a absorção adequada de P no algodoeiro, podendo resultar em sintomas de toxicidade de P em condições hidropônicas (Figura 2). Do mesmo modo, pouco P disponível para absorção pela planta prejudica a absorção adequada de Zn, induzindo sintomas de toxicidade por Zn. Desta maneira, fica claro que o maior crescimento da planta de algodoeiro só é alcançado com alta disponibilidade de P e Zn conjunta, e a maior disponibilidade de apenas um desses nutrientes separadamente pode levar a deficiência ou toxicidade, resultando em baixa eficiência na assimilação de CO2, acarretando perda de produtividade.
Figura 2. Sintomas de toxicidade por P em folha diagnósticas de algodoeiro cultivado em solução nutritiva com altos teores de P (4 mM) e omissão de Zn em solução. Fonte: Modificado de Santos et al. (2019).
Destaca-se também que em condições de alta disponibilidade de P pode ser observado o efeito de diluição em relação ao Zn. Isso ocorre em função do alto crescimento da parte aérea que não acompanha o aumento da capacidade de absorção de Zn. Entretanto, deve-se ressaltar também que os resultados na literatura para a deficiência de Zn induzida pelo P poderiam raramente ser explicados somente pelo efeito de diluição, pois raramente também são relatadas as reduções das concentrações de outros micronutrientes (BOUAIN et al., 2014; ZHANG et al., 2012).
O desequilíbrio no suprimento de P e de Zn às plantas de algodão promove redução nas trocas gasosas, nas relações fotoquímicas e ineficiência do metabolismo antioxidativo. O desequilíbrio no suprimento de P e de Zn para o algodoeiro desregula uma série de eventos biológicos, resultando em deficiência por P ou Zn. A adequada nutrição por Zn em plantas de algodoeiro cultivadas com baixos teores de P, promove a atenuação do estresse oxidativo causado pela deficiência por P, pelo estímulo de enzimas relacionadas com o sistema antioxidativo (SANTOS, 2018). Outro fator que explica o aumento da eficiência nutricional de P pela adequada nutrição por Zn em algodoeiro, é o incremento da atividade da fosfatase ácida – principal enzima relacionada a eficiência de uso de P no metabolismo vegetal.
Foi relatado que plantas com teores foliares de Zn adequados e deficientes em P demonstram uma maior atividade da fosfatase ácida maior do que plantas deficientes em P e Zn (SANTOS, 2018). A alta atividade da enzima fosfatase ácida como resposta adaptativa à baixa disponibilidade de P tem sido observada em diversas culturas. Em condições de baixa disponibilidade de P as plantas utilizam a fosfatase ácida para promover a desfosforilação de compostos orgânicos, disponibilizando P inorgânico para manutenção do metabolismo celular (ZEBROWSKA et al, 2011; ZAMBROSI et al., 2015). Portanto, os efeitos do Zn na eficiência nutricional de P pelo algodoeiro é resultado de um conjunto de modificações no metabolismo vegetal que se inicia a nível molecular.
Em condições normais sem estresses fisiológicos, a dinâmica nutricional de P é controlada por uma série de sinais moleculares. Contudo, a deficiência de Zn reduz a expressão de genes que codificam proteínas responsáveis pela absorção de P pelas raízes, como a expressão de genes da família PHT1 (HUANG et al., 2000; BOUAIN et al., 2014; KHAN et al., 2014).
Figura 3. Comparação da expressão do gene PHT1.1 em raízes de algodoeiro não deficientes em zinco (+Zn/vermelho escuro) com plantas de algodão deficientes em Zn (-Zn/amarelo escuro), cultivadas em solução nutritiva com baixa concentração de P (0,5 mM). Fonte: SANTOS (2018).
O PHT1 está envolvido na absorção de P a nível celular, bem como envolvidos na sinalização de deficiência por P (MUCHHAL e RAGHOTHAMA, 1999; SECCO et al., 2010). Contudo, no algodoeiro a expressão de genes da família PHT1 em resposta a deficiência por P, só ocorre em plantas com suprimento adequando de Zn (Figura 3). Isso indica claramente que a expressão de genes PHT1 é controlada não somente pelo status P, mas também pelas concentrações foliar de Zn em algodoeiro, provavelmente através de uma coordenação entre a sinalização da deficiência por P e uma adequada concentração de Zn foliar. Assim, sob deficiência de Zn, as plantas de algodoeiro perdem a capacidade de regular a expressão de alguns genes que codificam transportadores de P de alta afinidade nas raízes. Curiosamente, a interação P × Zn parece ser específica, uma vez que a expressão de transportadores de P não é induzido por outros macro ou micronutrientes testado em raízes de cevada (HUANG et al., 2000). No entanto, a regulação complexa da interação P × Zn ainda precisa ser investigada para indicar a sinalização de vias que são ativadas pela adequada concentração de Zn foliar.
As interações de P com outros nutrientes têm sido geralmente negligenciados no manejo de adubação. O uso do conhecimento de interações mais amplas de nutrientes deve ser utilizado para o aumento da eficiência de uso e absorção de P pelas culturas agrícolas. O fornecimento ideal de Zn é crucial para obtenção do efeito máximo das aplicações de fertilizantes fosfatados em algodoeiro. Assim, manejos nutricionais que se concentram na gestão equilibrada de nutrientes poderiam reduzir o uso de fertilizantes fosfatados, reduzindo a escassez futura de P.
REFERÊNCIAS
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